domingo, 28 de agosto de 2011

Serra Preta - Delfinópolis - Julho 2011


Planejamento

Eu, Tiago, e meu amigo e xará Tiago Peixinho planejamos nossa segunda caminhada na Serra Preta, Delfinópolis, para três dias, de 9 a 11 de julho de 2011.
O plano inicial era começar a caminhada na face sul da Serra Preta, nas terras do Ézio, passando pelo Morro Dois Irmãos. e chegar até a cachoeira da Maria Concebida, na Serra do Cemitério, subsequente àquela. Ou seja, teríamos que transpor a Serra Preta e atravessar o Vale da Gurita, para chegar aos pés da Serra do Cemitério , nosso destino, e fazer o caminho de volta. O caminho planejado era bem longo, e só tínhamos conhecimento preciso da caminhada até o Morro Dois Irmãos, por um caminho marcado com GPS conseguido na internet. O restante das informações foram conseguidas com o próprio Ézio e sua mulher, antes da partida.

A Serra Preta

Uma pequena explicação sobre o perfil da Serra Preta. A Serra Preta faz parte da Serra da Canastra, mas na região o parque ainda não foi implementado e as terras continuam sendo particulares. Basicamente o que encontramos é um conjunto de três serras paralelas, na sequência: A Serra Preta, a Serra do Cemitério (que mais adiante alarga-se, formando o Chapadão da Babilônia) e a Serra da Canastra propriamente dita, conforme a figura abaixo:

Panorama geral do conjunto da Serra da Canastra


E com mais detalhes na região onde fizemos a caminhada, na Serra Preta, no próximo mapa.
É interessante notar que a Serra Preta, apesar de não apresentar os grandes chapadões característicos das demais, possui pequenos chapadões de ambos os lados da serra, formando como se fossem “terraços” altos, antes da Serra cair abruptamente de ambos os lados, onde se encontram as quedas d'água. Estes “terraços” formam superfícies relativamente planas, tanto que foram os lugares onde acampamos.
A Serra Preta



1° Dia
I
nício da caminhada até o Morro Dois Irmãos
 
O início da caminhada: Tiago Peixinho à esquerda e Tiago Martins à direita

Após uma explicação demasiadamente detalhada do caminho com o Ézio, começamos a caminhar. O primeiro trecho, até o Morro dos Dois Irmãos, é relativamente simples, apenas no começo nos perdemos um pouco, mas depois a trilha fica bem demarcada. A subida é bem cansativa – um desnível 400 metros– mas o clima fresco e a paisagem da região ajudam. 
 
Chegada ao Morro Dois Irmãos
Chegando ao Morro, no bem na crista da Serra Preta, deixamos a mochila na trilha de volta e, sem o peso extra, andamos por todo o local, que tem pequenos morros que se destacam na paisagem e são facilmente escaláveis. 

Foto a partir do Morro Dois Irmãos
 
O GPS estava marcando que por ali passava um rio, mas depois de procurar um pouco percebemos que devia ser um erro de localização.
Não marcamos o local exato onde tínhamos deixado as mochilas e perdemos alguns minutos em zigue zague até encontrá-las. A vegetação, apesar de baixa, confunde bastante!
Caminhada na crista da Serra
 
Iniciamos a caminhada pela crista da serra, na direção sudeste, pois de acordo com as informações do Ézio existe apenas um caminho capaz de atravessar até o outro lado da Serra Preta. A caminhada na crista da serra é agradável, pois, apesar do sol, venta bastante e a paisagem é maravilhosa, com a visão completa dos dois lados da serra. Mas o que mais impressiona aqui é a vista do outro lado da serra, mostrando o rio Santo Antônio serpenteando o Vale da Gurita e as impressionantes reentrâncias da Serra do Cemitério que sobem formando um chapadão, uma vista de tirar o fôlego!


Vale do Rio Santo Antônio e Serra do Cemitério ao fundo

Sem caminho

Já estávamos andando a bastante tempo, sem encontrar o caminho para descer ao outro lado da serra. Na verdade passamos por várias pequenas depressões que levavam serra abaixo, mas seguindo as instruções do Ézio seguimos o caminho encontrado na crista da serra. Porém chegou um momento que o caminho sumiu! O Ézio tinha comentado este fato, mas não conseguimos achar o a continuação da trilha, e pra ajudar a água estava acabando.

Busca por água

Aqui chegamos a um impasse: ou continuar tentando achar o caminho que descia à esquerda na serra, levando-nos em direção à uma mina de água indicada pelo Ézio e colocando-nos no caminho da cachoeira da Maria Concebida, ou virar à direita, descendo o caminho de volta às cachoeiras do Ézio, desistindo de nosso destino inicial.
Aqui devo constar uma imprudência minha, que insisti com meu colega de trilha que não levasse o reservatório extra de água, pensando que acharíamos água com facilidade pelo caminho. O fato é que já estávamos praticamente sem água e a sede já estava atrapalhando.
Decidi subir num morro próximo, para tentar encontrar com um caminho de descida pela face norte da serra, quando me deparei com a visão de uma bela cachoeira ao pé da serra. Me enchi de esperanças e tentamos descer a face da serra por uma das reentrâncias que tínhamos passado.
O início da descida foi muito íngreme e cansativo, mas logo nos encontramos num platô da serra, um “degrau” acima que bastava descer para chegar ao vale e à cachoeira que tinha avistado.
Mas foi pura ilusão, pois perambulamos por todos os lados sem encontrar nenhum caminho viável de descida, pois todos que tentávamos acabava em um desfiladeiro intransponível!
Completamente exaustos paramos para descansar e decidir o que fazer. Meu colega sugeriu voltarmos ao outro lado da serra, para as cachoeiras do Ézio, mas só de imaginar subir o caminho íngreme que descemos, cansados como estávamos, com as mochilas pesadas e com início de desidratação, me dava arrepios! Passar a noite ali sem uma gota de água também não era nada animador!
O “poço da esperança”

Comecei a ficar realmente preocupado com a nossa situação! Por fim, me sentindo responsável pela falta de água, resolvi vasculhar o local para ver o que encontrava. Percebi uma pequena reentrância próxima a nós, que devia ser um filete de água na época da chuva, e chegando perto vi que tinha água brotando das paredes, mas a quantidade era muito pequena para ser utilizada. Sem desistir desci ao longo da reentrância e finalmente encontrei um poço de água. Foi nossa salvação! A água não estava corrente, mas bem limpa e fresca, brotando das paredes do poço. Busquei os cantis e matamos a sede. Comemos um lanche e, reanimados, voltamos à caminhada.


O poço da esperança
Caminhando a esmo

Já estava relativamente tarde – por volta de 16h30 – quando reiniciamos a caminhada. Encontramos um trilho de bois e, já desistido de nosso objetivo inicial, começamos a segui-lo, na esperança de descer a serra para tentar acampar próximo de um rio, desejosos de um bom banho de cachoeira. Mas quem disse que conseguimos! O trilho terminou no nada, e ficamos a ver navios. Neste momento o cansaço começou a bater pra valer, e comecei a ter câimbras nas pernas enquanto andava.

Acampamento selvagem

Exaustos e sem esperanças, acabamos por acampar em um lugar com um pouco menos de mato que encontramos. Na verdade este acabou sendo o primeiro camping realmente selvagem que fizemos. E o melhor, com as Serra do Cemitério bem na nossa frente, formando uma belíssima paisagem!
Camping Selvagem
 
Armamos as barracas e voltamos à “fonte da esperança”, que acabou sendo o único lugar com água limpa que encontramos. Tomamos um banho de canequinha e enchemos os cantis e a panela, para fazer o jantar mais tarde.
De volta ao acampamento estávamos planejando fazer uma fogueira, mas com a quantidade de capim seco ao redor seria muito imprudente. Assim decidimos adiar mais esta aventura. De qualquer forma limpei uma pequena parte do terreno para montarmos o fogareiro. Preparamos a comida, jantamos e, fomos dormir às 19h30, de tão exaustos que estávamos!

2° dia - Procurando um caminho para volta.
Decidimos não ter hora para acordar, e no final das contas saímos das barracas já passava das 9h. Tomamos o café da manhã e desarmamos o acampamento.
Nosso objetivo agora era encontrar um caminho para subir até o topo da serra e descer do outro lado, onde acamparíamos na parte de cima das cachoeiras do Ézio.
Não sabíamos qual o melhor caminho a tomar - e o caminho que tínhamos vindo era muito ruim – assim decidimos deixar as mochilas na trilha para buscar água no poço da esperança e tentar encontrar um passagem mais fácil para a subida.
Esta decisão foi muito sábia, pois após muito vasculhar subimos um morro e meu companheiro encontrou um caminho que parecia ser viável, e sem as mochilas acabamos não cansando tanto.

o morro que subimos para tentar encontrar um caminho
Uma coisa interessante que encontramos no meio do caminho foi uma cerca entre dois montes, no meio do nada, que devia ser muito antiga e hoje provavelmente não tem nenhuma utilidade.

O início da subida.

Pegamos as mochilas e iniciamos a trilha para subida. O sol já estava bem forte, era quase meio dia, e começamos a nos arrepender por acordar tão tarde. Mas no final das contas não foi tão ruim, pois a trilha que visualizamos, apesar de ser muito cansativa - o que não podia ser diferente – foi bem tranquila.
Ao chegarmos no topo meu companheiro percebeu que tinha deixado cair a máquina fotográfica na trilha, mas ela estava perto de onde nos encontrávamos.

Trilha de descida até o Ézio.

Após uma pequena pausa para o lanche, recomeçamos a andar na crista da Serra Preta, no sentido sudeste que estávamos vindo, mas agora pendendo para a direita, para tentar encontrar a trilha que levava até a parte de cima do Ézio, o “terraço” onde nasce o Córrego do Dr. Pinto, o rio das cachoeiras do Ézio. Sabíamos que deveríamos andar bastante antes de tentar a descida, pois já estávamos avisados que o único local seguro de descida era bem mais à frente.
Andamos um pouco e acabamos encontrando a trilha que nos levou até o córrego, onde paramos para nos refrescar e almoçar. Neste momento veio ao nosso encontro um motoqueiro perdido, que não sabia onde estava e pediu informações de como sair dali. Tentamos ajudar e ele seguiu o caminho no sentido da Casinha Branca, o único possível segundo o Ézio nos disse depois.

Segundo Acampamento

Depois de almoçar começamos a procurar um local para acampar próximo ao rio. Encontramos um terreno bem plano e com pouco mato, a poucos metros do rio, perfeito! Perto do camping do dia anterior, este era um hotel! O único inconveniente era o solo relativamente raso, o que dificultou um pouco a colocação das estacas das barracas. Montado o acampamento fomos tomar banho e começar os preparativos da fogueira.

O segundo dia de acampamento
A fogueira

A fogueira acabou sendo uma diversão à parte. Mesmo o terreno estando com pouco mato, tomamos muito cuidado para fazê-la, já que estava tudo muito seco. Limpamos bem o terreno ao redor, arrancando os tuchos de capim, e cavamos um pequeno buraco, onde colocamos folhas secas e pequenos gravetos. O combustível é abundante, devido ao clima seco da região, que impede os galhos e árvores mortas de apodrecerem, bastando coletá-los.
Até tentamos utilizar métodos mais primitivos para acender o fogo, como a fricção de dois pauzinhos ou mesmo o faiscador que meu colega tinha levado, mas logo percebemos que o fogo não sairia dali e um único fósforo foi suficiente para começar a fogueira.
Assim que o fogo pegou bem colocamos os galhos mais grossos e cercamos a fogueira com pedras, para maior segurança e apoio da panela.
Levei também uma batata doce e que enterrei próximo ao fogo e ficou muito saborosa, tornando-se um item indispensável para as próximas aventuras, mesmo com uma leve crocância de areia :o)

A fogueira
Lua quase cheia

Fizemos o jantar e ficamos conversando à beira do fogo, já que neste dia tínhamos andado bem menos que o anterior e não estávamos tão cansados. A lua era um espetáculo à parte, estava quase cheia deixando a noite bem clara. Praticamente não precisamos de lanternas quando fomos ao rio buscar água. A vista da serra também era muito bonita, e podíamos ver toda a cidade de Delfinópolis de onde estávamos.

Quando a fogueira por fim apagou enterramos as brasas com areia e fomos dormir. Estávamos planejando acordar de madrugada para subir a serra e ver o sol nascer do outro lado. Até acordamos por volta das quatro da manhã, mas, como era previsível, o frio e a preguiça impediram-nos de sair da barraca. Voltamos a dormir e acordamos por volta das sete e meia, e o sol ainda não tinha galgado a serra em frente ao nosso acampamento.

dia

Tomamos café, arrumamos as coisas e deixamos as mochilas debaixo de uma árvore próxima, para poder explorar a região. Nosso objetivo era ir de encontro a uma garganta na encosta da serra à nossa frente, de onde vinha o Córrego do Dr. Pinto. Decidimos tentar ir por cima e ver o que encontrávamos. Atravessamos alguns trechos onde o solo foi recortado em valas profundas, provavelmente por um rio intermitente, como podemos ver na foto:

Leito seco do rio intermitente
Subimos por um dos lados da garganta e chegamos à parte de cima dela, onde as rochas erodidas formavam esculturas interessantes. Mas, mesmo chegando na beirada da garganta não foi possível avistar o fundo, devido à grande profundidade. Jogamos uma pedra e - usando meus vastos conhecimentos de física ;o) - calculamos a altura em torno de 130 metros. Demos uma pausa para descansar e começamos a voltar. O lugar é muito bonito, mas já estava na hora de irmos embora. Combinamos uma próxima vez tentar entrar na garganta pelo leito do rio, que parece ser uma boa aventura.

Rumo de casa

Voltamos pelas cachoeiras do Ézio, trilha já bem conhecida. Viemos sossegados, parando para nadar em algumas cachoeiras. O Pexe me levou para conhecer uma cachoeira escondida, acessível apenas descendo um grande barranco e depois nadando uns 30 metros numa garganta, até chegar numa belíssima cachoeira. Muito bonita mesmo!
No caminho de volta, para mostrar como o mundo é pequeno mesmo, encontramos um maluco que estava acampando no Ouro quando fizemos a trilha anterior, e agora estava no Ézio.
Ao chegar no final da trilha tomamos banho e, depois de um dedo de proza com o Ézio, tomamos o rumo pra casa, já planejando a próxima aventura!